MEDITAÇÕES DE DOM KARL JOSEF ROMER


 B 12 23º Domingo
Is 35,4-7a; Tg 2,1-5; Mc 731-37

1) “Criai ânimo, não tenhais medo!” (Is 35,4-7ª)
A primeira leitura, cap. 35 de Isaías, só se entende ao ler também o capítulo 34. Esta “pequena Apocalipse” do livre de Isaías anuncia o juízo sem misericórdia contra “todas as nações” e especialmente contra Edom infiel. “A cólera do Senhor atinge todas as nações, o seu furor todo o seu exército” (34,2).
Sobre este plano de fundo, o anúncio de felicidade para Jerusalém é tanto mais expressivo. Seno batismo, Jesus faz o seu pacto de amizade individual com cada alma, então se deveria repetir estas palavras a cada cristão aflito, a cada um que sofre inocente, enfim àqueles que trabalham fielmente, mas que nunca colhem para si os frutos almejados: “Criai ânimo! Vede, é vosso Deus..., é Ele que vem para vos salvar” (4). Tantas vidas sofridas, que se consideram deserto estéril, devem ouvi-lo: “Brotarão águas no deserto e jorrarão torrentes no ermo, a terra árida se transformará em lago!” (6-7).
Assim é nossa esperança, nossa confiante certeza: Deus fará tudo novo, dará vida e júbilo aos seus pequenos servos.

2) “Tu, com tua roupa surrada, fica aí de pé!” (Tg 2,1-5)
“Não vos tornastes juízes com critérios injustos?”, pergunta o apóstolo, se veneraiaquelesenhor bem vestido e com o seu impressionante anel de ouro no dedo”, e se humilhais o pobre, talvez de coração reto e puro!
A graça da salvação e de nossa santidade vem unicamente de Deus; mas esta graça só se conserva e se enriquece através de nossa relação com os irmãos. Pois “Deus escolheu os pobres para serem herdeiros do Reino de Deus prometido aos que O amam” (5).
juízo de Deus acontece não no ruído do mundo, mas entre a Sua eterna santidade e o silêncio do coração puro, ou perverso.

3) “Ele tem feito bem todas as coisas” (Mc 7,31-37)
A saliva humana, segundo as circunstâncias de seu uso, pode ter significados diversos. Como hoje ainda pode acontecer em certos meios bem populares, assim, Jesus, em diversas ocasiões (Mc 7,33; 8,23; Jo 9,6), usa a saliva como sinal de força curativa. Com este gesto, conhecido pelo povo, Jesus se iguala a eles. Mas com o milagre, que provoca, Ele ultrapassa infinitamente toda expectativa, opera o mais poderoso milagre da divina onipotência e cura o surdo-mudo.
A multidão tinha razão quando falava: “Ele tem feito bem todas as coisas: aos surdos faz ouvir e aos mudos falar” (37).
E nós devemos, na oração confiante, levar nossos doentes a Jesus. E nós mesmos devemos pedir que Ele nos toque os ouvidos e a língua, para que saibamos ouvir a dor do mundo e a Palavra de Deus, e possamos falar com divino afeto a todos os que sofrem. E, assim, começaremos a proclamar o júbilo de gratidão diante de Deus que, também em nossa vida, “tem feito bem todas as coisas!” (37).




Tempo Comum 12º Domingo

Jó 38,8-11; 2Cor 5,14-17; Mc 4,35-41




1) A resposta de Deus do seio da tempestade (Jó 38,8-11)
Deus apresenta-se como o Senhor absoluto de todo o universo com suas potências, cujas forças parecem ultrapassar todas as medidas: “Até aqui chegarás, e não além; aqui cessa a arrogância de tuas ondas!” (11). O total significado desta verdade será entendido somente lá onde o próprio Deus, em Jesus, se deixa tragar pela fúria do mundo e, morrendo, quebrará na ressurreição, a partir de dentro, a aparente onipotência da morte.

2) Agora tudo é novo (2Cor 5,14-17)
Uma admirável e divina novidade da existência cristã apresenta-se neste texto de S. Paulo aos Coríntios.
Tudo tem sua raiz e seu centro em Cristo. O amor tão inefável que Cristo nos ofereceu, “quando nós ainda éramos pecadores” (Rm 5,8), este amor é a causa e o último motivo de nosso amor, pelo qual nos entregamos ao trabalho incansável. Este amor “nos pressiona” (14).
Como sua morte foi morte vicária, morte de expiação por todos nós, então já temos (podemos ter!) parte na força redentora da Cruz. E por esta mesma morte é dada a todos a real possibilidade de ter acesso a uma nova comunhão com Deus. “De fato, Cristo morreu por todos, para que os vivos não vivam mais para si mesmos, mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou” (15). Por este amor divino, já não pertencemos a nós mesmos, mas àquele que por nós se entregou, pagando por nós um preço alto (cf. 1Cor 6,19-20; 7,23).
“Para que os vivos não vivam mais para si mesmos” (15), somos, então, “vivos para Deus” (Rm 6,10).
Enquanto Paulo “conhecia o Cristo somente segundo a carne”, conhecia-o segundo critérios do mundo, como crucificado e maldito por Deus (Gl 3,13), só podia odiá-lo. Mas agora o conhece segundo o Espírito, como ressuscitado, amado por Deus, como Deus eternamente santo que se tem humilhado a si mesmo por nós (16). E, neste conhecimento de Cristo, Paulo conhece a mais segura verdade sobre a pessoa humana: amado em Cristo, vive em Deus e para Deus.
Para quem tem fé e amor a Jesus, “tudo agora é novo!” (17). Por mais que ainda estejamos no mundo, que nos faz sofrer, o mundo já não tem poder decisivo sobre nós. “Somos nova criatura; o mundo velho – em nós – desapareceu (17).

3) Jesus dorme na tempestade (Mc 4,35-41)
Dois momentos no Evangelho:
Jesus dorme na tempestade. – Será que ele não está presente também nas preocupações e tempestades em minha vida? Talvez eu precise acordá-Lo mais vezes, suplicando-lhe: “Salvai-me, protegei-me, Senhor!”
O outro momento é a bonança que Ele faz surgir da tempestade: “Silêncio! Cala-te!” (39). A luz divina na face de Cristo e a força onipotente que transparece de seu gesto assustam os apóstolos. “Eles sentiram um grande medo e diziam uns aos outros: «Quem é este, a quem até o vento e o mar obedecem»?” (41).
Pela fé em Jesus, pela santa comunhão com Ele, este mesmo Deus vive dentro de mim, dentro de nós. Não devemos ter medo dele, nem na hora do perigo, nem na hora da morte, mas devemos nos refugiar e confiar a ELE. – É belo que Ele esteja na barca de minha vida!

Páscoa
At 10,34ª.37-43; Col 3,1-4; Jo 20,1-9

 1) Comemos e bebemos com ele, depois que ressuscitou At 10,34a. 37-43
Páscoa nem é uma festa luminosa, nem uma maravilhosa idéia. É um fato que marcou absolutamente a história. Não se pode apenas narrar os fatos que marcaram esse acontecimento. Só se pode testemunhar, com todo o empenho da própria vida. Aliás, na Igreja, no cristianismo, testemunho é a palavra mais radical, que caracteriza a Igreja. Na língua bíblica a palavra se traduz por “martyría”. E de fato o martírio tornou-se bem cedo a forma completa deste testemunho.
Este testemunho (martyría) refere-se à vida santa, divinamente sublime de Jesus na terra, refere-se a Seu testemunho diante de autoridades, e, finalmente, é a entrega da vida dos fieis pela indubitável verdade da vitória do Cristo gloriosamente ressuscitado; refere-se a divina certeza de nossa vida perdoada, santificada, chamada para a eterna comunhão com o Deus Santo.

2) Só o amor sabe ser grato
Maria Madalena sabia das ameaças sobre aqueles que acreditassem em Jesus, considerado, pelo Sumos Sacerdotes e os fariseus, proscrito, maldito pelo Templo. Não obstante, “bem cedo, quando ainda era escuro, ela foi ao sepulcro” (1). Só o amor puro é mais forte do que o ódio. Ela sabe o quanto sua vida tinha sido perdoada por Jesus. Nova em todo o seu ser, santa pelo amor e pela morte de Jesus, ela se torna a primeira testemunha (mártyr) da ressurreição.
Por que ela não vai para as outras mulheres? Por que vai a Pedro? Sem saber articulá-lo, ela sabe que o Cristo morto e ressuscitado pertence à Igreja, melhor: a Igreja pertence a Ele, pertence à vitória pascal. “Correu e foi dizer a Simão Pedro e ao outro discípulo a quem Jesus amava: Tiraram o Senhor do sepulcro” (2).
Dois testemunhos, ambos essenciais, são-nos dados pelos apóstolos. Pedro, com a devida objetividade, constata que o túmulo está vazio, fato absolutamente inexplicável por causa dos soldados (entrementes fugidos). Ele constata, como numa fotografia totalmente confiável, “os panos postos no chão... e o sudário que estivera sobre a cabeça de Jesus enrolado num lugar à parte” (7s). E saiu. Este testemunho, confirmado por outros no mesmo dia, será fundamental para toda a história da Igreja. Mas o outro testemunho, certamente mais sublime, é aquele de João. Ele precisa das constatações de Pedro, que ele faz suas. Mas como sua fé já é muito mais madura, mais completa, enraizada em Deus pelo amor pessoal a Jesus, João não somente vê e constata, mas deixa desabrochar em sua alma a fé: “ele viu e creu!” (8).
Em Pedro, a Igreja, durante todos os tempos, terá a segurança dos fatos. Em João ela terá, juntamente com essa segurança, o júbilo de uma fé que é o mais fecundo desabrochar do amor divino na Igreja. Ele, o discípulo a quem Jesus amava, é protótipo da Igreja, que hoje celebra a Páscoa. “Viu e acreditou!”. O amado redentor vive!

3) “Vossa vida está escondida com Cristo em Deus” (Cl 3,1-4)
A Igreja que é a discípula a quem Jesus ama. Ela deve caminhar neste mundo na certeza de que a ressurreição não será apenas um inefável dado final. Sim, o será, mas é mais, muito mais. Pelo batismo, já começou em nós a força real da ressurreição. Já trazemos em nós o primeiro esplendor do Cristo ressuscitado, transformando-nos, desde agora, em co-ressuscitados com Ele. É verdade, o que já somos, ainda está coberto de tanta aparência de mortalidade, de insegurança e de medo. Mas vive em nós a esperança invencível da Páscoa de Jesu, já iniciada em nós. 


5º Domingo da  Quaresma


                                                      Jer 31,31-34; Hb 5,7-9; Jo 12,20-33
1) Só Deus pode dar o início absolutamente novo (Jer 31,31-34)
A divina prodigalidade da promessa de uma nova Aliança fica mais evidente, se relermos as dolorosas palavras do capítulo onze do mesmo profeta Jeremias. Só as lágrimas de Jesus sobre Jerusalém serão mais graves do que os lamentos de Deus neste 11º capítulo: “Conduzi o meu povo do Egito, da fornalha de ferro... conclui com ele a aliança... Mas a casa de Israel e a casa de Judá romperam a minha aliança” Esta traição contra Deus, “correndo atrás de deuses estrangeiros” (11,10), chama sobre o povo “a desgraça” de já não merecerem ser ouvidos por Deus (11,1-17).
Tanto mais grandiosa e surpreendente é a promessa da aliança nova e mais sublime (31,31ss). Esta já não se mede por conceitos contratuais, mas será a realização da mais radical graça de Deus para com seu povo. “Escreverei minha Lei em seu coração. Então eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo” (31,33).
Somente a nova Páscoa de Jesus será a divina realização de tudo isso.

2) O Filho de Deus, feito homem, é o divino Redentor (Hb 5,7-9)
O mais santo homem, o mais sublime profeta, ninguém terá a possibilidade de realizar o plano de Deus. Somente Deus em pessoa pode fazê-lo. Por isso – embora Ele fosse Filho – a aliança nova passará pela humilhação de Deus. O Santo, o Três vezes Santo, suportará, pelos culpados, os sofrimentos; o divino será humilhado em sua existência humana, para, por Sua obediência, nos arrancar das cadeias, que nos foram impostas pela desobediência do pecado. O retrato deprimente do versículo 7: “Nos dias de sua vida mortal, dirigiu preces e súplicas, entre clamores e lágrimas, àquele que o podia salvar da morte, e foi atendido pela sua piedade”, transforma-se em ícone pascal se nos lembrarmos que desta morte surgirá a glória da ressurreição e de nossa santificação.

3) Chegou a hora (Jo 12,20-33)
A pergunta, de aparente curiosidade: “Quiséramos ver Jesus” é levada a sério e Jesus responde com uma sublime auto-revelação. Nesta resposta se vê que somente a Páscoa, dolorosa Paixão e gloriosa Exaltação podem definir o mistério de Jesus. É chegada a hora para o Filho do Homem ser glorificado. Esta glorificação acontecerá com o processo da morte do grão de trigo, que fará brotar vida infinita. Aqui aparece, de modo muito eloqüente, que a elevação na Cruz, é o início (e parte constitutiva) da Sua elevação para a Glória do Pai (23-24).
Abre-se, grandiosa, a segunda perspectiva: Esta elevação para a glória é o destino também do discípulo. Meu destino, nosso destino! “se alguém me quer servir, siga-me; e, onde eu estiver, estará ali também o meu servo. Se alguém me serve, meu Pai o honrará” (26).
Apresenta-se, neste texto, uma síntese da maravilha da vida cristã. Devemos e queremos seguir o Cristo, e segui-lo como grão de trigo que, caído na terra, deve morrer. Mas, quem o segue no dia a dia, terá a certeza, divinamente infalível de “estar com Ele, onde Ele está na glória do Pai” e de ser “honrado por Seu Pai” (26).
A Igreja já não consegue esconder o mistério pascal. A discrição da liturgia, as imagens e Cruzes cobertas, o canto mais meditado, as preces íntimas, tudo já reflete sobre a comunidade cristã a gravidade da Paixão e a certeza da glória, que nos espera. 

4º Domingo da Quaresma
2 Cr 36,14-16.19-23; Ef 2,4-10; Jo 3,14-21
1) A misericórdia de Deus supera toda infidelidade 2Cr 36,14-16.19-23
Este último capítulo do segundo livro das Crônicas narra a definitiva decadência do povo de Deus. Primeiro, o rei do Egito retirou o rei de Jerusalém, impondo ao país, além de graves tributos, um novo rei, Joaquim. As abominações praticadas por este manchavam a terra santa, o povo, e a aliança divina. Nabucodonosor prendeu o rei e o levou como prisioneiro para Babilônia. O filho do rei deportado, também ele se chama Joaquim, “Fez mal aos olhos do Senhor” (9). Também este deportado para Babilônia teve como sucessor Sedecias, que levou o reino à catástrofe final.
“Igualmente, todos os chefes dos sacerdotes e o povo multiplicavam as infidelidades,... mancharam o Templo que Deus tinha consagrado e zombaram dos mensageiros enviados por Deus (14-16). Foi queimado o Templo (19), derrubaram as muralhas de Jerusalém, e Nabucodonosor deportou para o exílio em Babilônia o resto da população” (20). Surge, então, Ciro, rei da Pérsia. Ele derrubou o poder de Babilônia, libertou o povo judeu, deixando-o regressar a Jerusalém. Veneravam a Ciro como se fosse o Messias. Todo sofrimento e toda humilhação transformaram-se em triunfo. Ciro, instrumento do plano de Deus, mandou reconstruir o Templo (23). Um imenso sofrimento virou indizível esperança.                                                               2) “É gratuitamente que fostes salvos” (Ef 2,4-10)
A tão breve segunda leitura oferece-nos uma magnífica síntese do drama do pecado e da onipotência da graça. “Não é nosso mérito, mas é puro dom de Deus” (2,8). A radicalidade da redenção expressa-se nesta frase: “Quando estávamos mortos em conseqüência de nossos pecados, deu-nos a vida juntamente com Cristo” (5). É preciso abandonar-se na fé a Deus, mergulhando na morte de Cristo, então Deus “nos ressuscita com Cristo e nos faz assentar nos céus com Cristo Jesus” (6). O Evangelho completa maravilhosamente esta visão em Jesus Cristo.

3) A serpente levantada (Jo 3,14-21)
No deserto, ficaram curados da mordida mortífera, os que olhavam para a serpente de bronze colocada sobre uma haste.
“Faze para ti uma serpente abrasadora – disse Deus a Moisés – e mete-a sobre um poste. Todo o que for mordido, olhando para ela, será salvo” (Nm 21,8). Aquilo era somente uma imagem longínqua daquilo que Jesus é: a presença salvadora de Deus para o mundo inteiro.
Jesus promete-o, interpretando assim a sua morte: “O que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna” (16). Sua morte, sua Cruz é a única fonte de vida eterna. É isto o grande tema da quaresma, em preparação para a Páscoa: Olhar para ele, com fé, com infinito amor e gratidão!


 3º Domingo de Quaresma

Ex 20,1-17 (20,1-3.7-8.12-17); 1Cor 1,22-25; Jo 2,13-25
1) A norma de todas as normas: a vontade de Deus (Ex 20,1-3.7-8.12-17)
É impressionante o zelo com que a Bíblia valoriza o Decálogo (os Dez Mandamentos). Não somente a completa enumeração dos dez preceitos é decisiva, mas a santa vontade de Deus, que neles se manifesta. Os mandamentos estão inscritos no íntimo ser do homem; e a sua observação dá paz com Deus e com o próximo.
Com ênfase, o Deuteronômio exige que se aprenda de cor o decálogo e os pais o ensinem aos filhos. Então os pagãos dirão: “Só existe um povo sábio e inteligente: é esta grande nação” (Dt 4,6.9-10; cf. Prov. 1,8; 6,20: veja: LThK² III,119-202).
Como Deus o tinha anunciado ao povo no Sinai, assim o sacerdote, “no fim de cada sete anos, durante a festa das Tendas, proclamava o decálogo aos ouvidos de todo o Israel... para que ouçam e aprendam a temer o Senhor Deus” (Dt 31,10-13). Pelo menos até o tempo do rei Salomão, as tábuas da Lei estavam guardadas na Arca da Aliança (1Rs 8,9.21). – Algumas dessas leis, talvez já valessem antes de Moisés (Gn 4,9; 6,5; 17,1). Mas pela proclamação divina, alcançaram valor supremo.
O Decálogo não apresenta questiúnculas casuísticas, como outras leis orientais antigas, mas em forma determinante decreta: “Tu farás... tu não farás!” Não uma autoridade humana, mas o próprio Deus dá esta lei. Por isso, as sanções ameaçadas são gravíssimas; não observá-la significa perder a vida (Lv 20,3-5; Dt 4,24).
Fora a santificação do sábado, não são indicadas normas cúlticas, mas exigências éticas universais: é a lei básica de toda norma.
Embora, mais tarde, o acento se desloque para a lei fundamental do amor (Dt6,5; Mt 22,36-40; Rm 13,9s; Tiago 2,8), o Decálogo continua a ser lei fundamental (cf. Mt 19,17s; Tiago 2,11; Mt 5,21s.27s; Mc 7,21s).
2) A lei de Cristo inverte as categorias humanas 1Cor 1,22-25
Esta inversão das normas humanas verifica-se especialmente no sofrimento e na experiência de injustiça: o que é escândalo para os judeus e loucura para os pagãos (isto é a Cruz) é, na verdade, “força de Deus e sabedora de Deus”. “Nós pregamos Cristo crucificado..., e a fraqueza de Deus é mais forte do que os homens” (1Cor 1,22.25). Crescer nesta sabedoria nova significa chegar à maturidade cristã, significa “revestir-se do Homem Novo, criado segundo Deus, na justiça e santidade da verdade” (Ef 4,24).

3) O zelo da casa do Pai me consome (Jo 2,13-25)
No gesto irascível da purificação do templo, Jesus dá testemunho da última e absoluta norma de sua vida: a glória do Pai deve ser adorada e manifestada, por todos os nossos gestos. Os judeus não têm como entender a palavra de Jesus: “Destruí vós este templo, e eu o reerguerei em três dias” (19). “Em quarenta e seis anos foi edificado este templo, e tu hás de levantá-lo em três dias?!” (20).
Como todos os gestos (e palavras) de Jesus são de um significado profundo, também nesta resposta de Jesus se anuncia não só sua morte e ressurreição iminentes, mas se apresenta o início da ordem absolutamente nova, em que “os verdadeiros adoradores, adorarão o Pai em espírito de verdade” (Jo 4,23). Seu corpo imolado, ressuscitado é o único templo novo. Toda revelação, toda redenção, toda a glória de Deus Pai está na Páscoa de Jesus. Se nela entrarmos, nossa vida participará da divina adoração. O culto, até então sagrado no templo, existirá somente em Jesus e naqueles que crêem e celebram Sua Páscoa. Assim, em Jesus e com Jesus, nossa vida do dia a dia pode tornar-se verdadeiro culto.


 
 2º Domingo da  Quaresma
Gn 22,1-2.9a.10-13.15-18; Rm 8,31b-34; Mc 9,2-10

As três leituras deste domingo abrem imensas perspectivas do mistério da Páscoa: 1) a disposição para os sacrifícios, 2) o sacrifício que se tornou glória, 3) uma grande contemplação de Cristo a caminho da Paixão.

1) Que é um sacrifício diante de Deus? Gn 22,1-2.9a.10-13.15-18
O teste que Deus faz com Abraão, exigindo a morte de seu filho, ensina-nos o que de fato é e deve ser um sacrifício diante de Deus. Não são apenas pesados incômodos, sofrimentos que merecem o nome de sacrifício espiritual. Deus não quer coisas de nós. Ele nos quer! O sacrifício quer a nossa auto-entrega, o nosso abandono de nós mesmos. Por isso, quando os acontecimentos pesam sobre nós, devemo-nos perguntar se de fato apenas carregamos ou empurramos os fardos, ou se aprendemos a relativizar a nós mesmos, oferecendo todo o nosso ser a Deus, Senhor da vida. Esta é a escola da espiritualidade que dura toda a vida.
Para Abraão, o sacrifício exigido significava a morte de seu único filho, o aniquilamento de toda a sua descendência, de sua história, de todos os sonhos. O anjo explica-lhe que Deus viu a heróica disposição: “Agora eu sei que temes a Deus, pois não me recusaste teu próprio filho” (12).
Como toda verdadeira oração quer e deve incluir e antecipar a hora da morte, assim, todo sacrifício é, por partes sucessivas, o ensaio generoso da futura entrega a Deus na própria morte.

2) “O que não poupou seu próprio Filho, nos dará tudo” Rm 8,31b-34
Diante do divino espetáculo da Páscoa de Jesus, justifica-se a esperança temerária, que São Paulo formula: “Se Deus é por nós, quem será contra nós?” (31). O sacrifício do cristão é total e irrestrita auto-entrega; mas o que Deus fez por nós é sempre mais, muito mais. O Deus Santo entregou-se por nós pecadores! Assim, tudo o que fizermos, será apenas a nossa tímida resposta, confiante em SUA benignidade. S. Paulo eleva a reflexão ao mais alto nível, que nos ensina a usar a Quaresma como uma grande experiência nova. Se realmente estamos em Cristo, estamos diante de Deus, estamos em Deus. Jesus inclui-nos na Divina comunhão trinitária. “Cristo Jesus, que morreu, ou melhor, que ressuscitou, que está à mão direita de Deus, é quem intercede por nós!” (34).
3) A transfiguração no “alto monte” Mc 9,2-10
O Santo Padre Bento XVI, em seu livro Jesus de Nazaré, I, p. 263-270, com magistral capacidade, mostra a riqueza deste evento. Enriquece-nos muito a leitura, se considerarmos pelo menos três aspectos: o monte, o momento da oração e a proximidade da Paixão.
Momentos gravíssimos na vida de Jesus acontecem “no monte”, lugar de especial proximidade com Deus: a vitória sobre a tentação, o sermão da montanha, a oração noturna, a agonia (monte das oliveiras), a Crucifixão (Calvário), o monte da despedida do ressuscitado e, hoje, o monte da transfiguração. Acontece aqui o inaudito de se tornar transparente todo o seu ser humano para sua total e eterna identidade divina. A montanha de Cristo é a mais radical oposição ao poder mentiroso de Satanás (Mt 4,8-11). No monte da despedida manifesta o poder, assumido na ressurreição: “Foi-me dado todo poder no céu e na terra” (Mt 28,18).
A transfiguração acontece como evento de sua oração; no íntimo diálogo com o Pai, todo o seu ser torna-se luz. A Igreja reza no Credo: Jesus, “Deus de Deus, luz da luz, Deus verdadeiro do Deus verdadeiro”.
Elia e Moisés falam com Ele da morte, da Cruz (cf. Lc 9,31). “À medida que falam com o Transfigurado, torna-se claro que esta paixão traz redenção; que Ele foi penetrado pela glória de Deus; que a paixão será mudada em luz, em liberdade e alegria” Bento XVI, I, p. 265).
A alegria no Senhor será sempre a nossa força,
cordialmente,
Rio 2 de março de 2012.   + Karl Josef Romer




7º Domingo do Tempo Comum
 Quaresma 1º Domingo  Ano B


Gn 9,8-15; 1Pd 3,18-22; Mc 1,12-15

1) Uma aliança com todos os seres

O dilúvio, que antecede o trecho da primeira leitura, marca a chegada de uma era nova; é vencida a lei do pecado. A Nova ordem a ser instaurada tem três dimensões: Deus é o Senhor absoluto; o homem só o pode ser centro e meta do universo porque é imagem de Deus (Gn 9,6); pelo homem, o universo recebe destino original de ser reflexo do plano de Deus. A superioridade do homem sobre o universo não preconiza arbitrariedade, mas coloca-o diante de Deus, de quem ele recebe, como expressão da divina semelhança, a lei moral. Quem peca contra a pessoa humana, sempre peca contra Deus e joga com sua própria vida (cf. Gn 9,5-6).

O versículo 16, que segue logo ao trecho da primeira leitura, poderia ser lembrado. Aqui já aparece que a aliança será eterna, o que só pode ser por causa do homem que, de um lado, é centro e meta do universo, do outro lado, ele e só ele terá uma história eterna com Deus.

2) Na redenção de Jesus, o universo tem seu centro absoluto 1Pd 3,18-22

Sua morte e ressurreição atingem todos os espíritos. A imagem de sua descida ao reino dos mortos (19) ilustra a universalidade sem limites de seu poder redentor, onde até “os incrédulos no Hades” são atingidos.

A Igreja não é uma associação de crentes; ela é, na história, o sacramento vivo e operante da obra pascal de Cristo. Muito mais do que o dilúvio, o batismo opera uma divina renovação do homem. E através da Igreja, já agora, temos a certeza de que “Jesus Cristo, tendo subido ao céu, está assentado à direita de Deus” (22). Na submissão a Ele de todas as criaturas, também dos espíritos, inicia-se o Reino de Deus, a nossa glória.

3) Até o deserto é lugar da instauração do Reino de Deus Mc 1,12-15

Três aspectos queremos realçar neste trecho do Evangelho: a entrada na tentação, a paz com o animais selvagens, a vitória sobre o tentador.

Ele, em tudo igual aos homens, fora o pecado, quer experimentar até mesmo a tentação. O Santo Padre Bento XVI interpreta este trecho com sabedoria: “Jesus deve penetrar no drama da existência humana, atravessá-lo até seu último fundo, para encontrar a (última) “ovelha perdida”, colocá-la nos seus ombros e levá-la para casa” (Jesus de Nazaré 1º volume, p. 40).

Por mais breve que seja o texto, ele abrange tudo. Até a profecia messiânica de Isaias 11,6 está se cumprindo na pessoa de Jesus. Sobre as feras do deserto, a presença de Jesus irradia serenidade paradisíaca (13).

E esta paz do “paraíso” já não é quebrada, mas Jesus vence o Tentador com sua divina santidade. Ele não é Adão. Ele é o Salvador do universo. Ouve-se no versículo 13 uma alusão ao Salmo 91(90),1: “Pois em teu favor ele ordenou aos seus anjos que te guardem em teus caminhos todos”. Só é que aqui os Anjos não o protegem, mas o “servem” (13). Os anjos são importantes para ilustrar a divina majestade daquele que vive em humildade de criatura, e é o Senhor da Glória (cf. 1Cor 2,8). E só ele era capaz de vencer com tal soberania a perversa astúcia de Satanás, que propõe suas tentações (descritas em Mt 4,1-11 e Lc 4,1-13) “não convida diretamente para o mal, mas pretende mostrar o que é melhor para nós...” (Bento XVI p. 41).

Termina, assim, o texto do primeiro domingo da Quaresma com a certeza de que se cumpre e se cumprirá a promessa de Jesus: “Vereis o céu aberto e os anjos de Deus subindo e descendo sobre o Filho do Homem” (Jo 1,51) (Cf. Bento XVI, l.c. pp. 41.55).

                                       
Is 43,18-19.21-22.24b-25; 2Cor 1,18-22; Mc 2,1-12

1) Os arroios pela estepe (Is 43,18-19.21-22.24b-25)
A imagem tem algo de surpreendente e de incrível. Sim, assim é a obra de Deus; ela ultrapassa todas as nossas categorias. Ela é graça absoluta que renova tudo. São imagens que proclamam a inaudita novidade de nossa alma, curada pela graça divina:
“Vou fazer correr arroios pela estepe” (19). O morador da estepe, feliz com poucas gotas d’água, entende a medida sem medida da graça de Deus que se esconde nesta eloqüente imagem.
Mais forte do que os arroios pela estepe é o anúncio de um paradoxo divino: “Tu me atormentaste com teus pecados” – “Quero... não mais me lembrar de teus pecados” (24s). Sim, Deus leva a sério o perdão; proíbe que nossa mente volte para trás. Tudo o que é perdoado transforma-se em divina graça. “Não vos lembreis mais dos acontecimentos de outrora, não recordeis mais as coisas antigas, porque eis que farei obra nova” (18-19).
Como é belo o que Deus faz: podemos olhar avante! Quem realmente mergulhou no divino perdão, não precisa se lembrar dos antigos acontecimentos, a não ser para louvar a Deus.
2) O nosso “Amém” para a glória de Deus (2Cor 1,18-22)
Agora, em Jesus, tudo tem um novo sentido, um sentido definitivo, sem retorno. No Antigo Testamento, a revelação da graça de Deus estava não raramente ameaçada pela necessidade do castigo ao povo infiel. Deus, finalmente, vai perdoar, vai reafirmar sua amizade; ou tudo já está perdido? Somente Jesus é a resposta total e irrevogável a esta pergunta. Ele não é apenas um gesto de amor de Deus para conosco. Ele é a última palavra salvífica. Jesus é, em todo o seu ser, o Testamento definitivo de Deus para nós. Numa fórmula, que tem algo de temerário, e, todavia ela é totalmente certa, Paulo diz: “Jesus não foi sim e depois não, mas sempre foi sim; Porque todas as promessas de Deus são sim em Jesus” (19-20).
         A este Deus, cuja misericórdia é irrevogável em Jesus, podemos dar só uma resposta, também ela total e irrevogável: “Amém!”. E este Amém, “nós o proclamamos para a glória de Deus” (20). Todo nosso ser, nossa vida deve ser um único louvor uma única adoração: o último “Amém”.
3) “Levanta-te, toma o teu leito e anda” (Mc 2,1-12)
         Descobrir o teto por cima do lugar onde Jesus estava é gesto de uma fé radical, sem hesitação. E Jesus é o tempo novo, no qual “já não devemos recordar as coisas antigas, porque eis que Ele faz obra nova!” (cf. Is 43,18s). O milagre exterior, espantoso para os circunstantes, é sinal da graça invisível do perdão dos pecados. “Ora, para que conheçais o poder concedido ao Filho do homem sobre a terra (disse ao paralítico), 11 eu te ordeno: levanta-te, toma o teu leito e vai para casa!” (2,10-11). Assim, na vida de cada um de nós, deve ressoar o “Sim” definitivo de Deus. Tudo é graça sobre graça! Mesmo que não vejamos com nossos olhos os frutos divinos em nossa vida, devemos nos erguer como o paralítico curado, devemos caminhar numa vida nova, e assim tornar-nos testemunhas visíveis de que a graça de Deus é operante no mundo, operante em nós, em mim, em você. Vale para nós, o que a última frase do Evangelho de hoje proclama: “No mesmo instante, ele se levantou e, tomando o. leito, foi-se embora à vista de todos” (2,12). 
   Deus é nossa força e nossa alegria, e jamais decepciona. (+ Karl Josef Romer)

6º Domingo do Tempo Comum



2Reis 5,9-14; 1Cor 10,31-11,1; Mc 1,40-45
1) Os poderosos do mundo e a onipotência de Deus 2Reis 5,9-14

A primeira leitura contrapõe a impotência humana ao poder de Deus, que só podemos tocar na humilde confiança. O texto é dramático. O protagonista, Naamã, reveste-se de todos os atributos do poder humano. É general ilustre de inúmeras vitórias. Leva consigo, além de uma fortuna de dinheiro, uma carta de recomendação da parte do grande Rei da Síria (5,5-6). Apresenta diante da casa do profeta todo o aparato de sua importância: “Naamã veio com seu carro e seus cavalos e parou à porta de Eliseu” (5,9).
  O profeta, interpretando a insignificância de toda essa pompa, diante do mistério da vida e da morte, e diante do único poder absoluto de Deus, nem sai da casa, manda um recado, cuja insignificância é humanamente evidente. O general, sentindo-se humilhado, irrita-se. Porém pelo bom conselho de um amigo, ele se submete. Na total confiança, não nos meios humanos, mas em Deus, ele descobre que nossa vida está totalmente exposta a Deus. Purificado de sua lepra, não só recuperou a saúde, mas descobre Deus. Confessa diante do profeta: “Reconheço que não há outro Deus em toda a terra, senão o de Israel” (5,15). Em cada sacramento, por exemplo, em cada confissão, experimentamos assim a onipotência de Deus, que muda nosso ser. Só pela fé, pela ilimitada confiança, tocamos em Deus e nos deixamos tocar por ELE.
2) “Eu quero, sê curado!” Mc 1,40-45

Diante de Jesus, todos os profetas são apenas tênues imagens. Jesus é o Senhor. O leproso deste Evangelho é protótipo de cada cristão. “Aproximou-se de Jesus,... suplicando-lhe de joelhos: “Se queres, podes limpar-me” (Mc 1,40). A narração é de indizível ternura: “Jesus compadeceu-se dele, estendeu a mão, tocou-o e lhe disse: Eu quero, sê curado!”(2).

Jesus pode fazer milagres, mas não quer, de modo algum, que todos só corram a ele para ver milagres. Só em Jesus mesmo, o mundo aprenderá que também o sofrimento, aceito com sabedoria e pureza de coração, torna-nos semelhantes a Deus. Jesus cura-o, mas não quer que o curado faça propaganda. Porque crer em Jesus, sem ter visto milagres é maior!

Grande é a mensagem deste texto: Cada um de nós pode, deve assim cair de joelhos e abandonar-se totalmente à compaixão e misericórdia de Jesus: “Se queres, podes limpar-me!” Com esta santa confiança carregamos a cruz de cada dia, com esta mesma certidão, entraremos, como os santos o fizeram, na morte, olhando para Aquele que nos ama. Jesus cura-me para a eternidade, para Deus e para eu ajudar os que sofrem.

3) “Tudo para a glória de Deus!” 1Cor 10,31-11,1

“Não busco os meus interesses próprios, mas os interesses dos outros, para que todos sejam salvos” (1Cor 10,33). Paulo gastou-se, sem limites, abnegou-se e viveu inimagináveis sofrimentos por causa do evangelho (cf. 2Cor 11,23-29). Ele obteve a divina graça de saber ofertar tudo a Deus, e tudo pelo bem do próximo. Ele é o comentário vivo à existência cristã. Seja na alegria, seja na vida, e na dor e mesmo na morte: “Fazer tudo para a glória de Deus!” (cf. 1Cor 10,31). Desde o batismo, é esta a norma dupla que orienta nosso ser. “Busco os interesses dos outros, para que todos sejam salvos!” (34), e isto só é possível numa vida que começou a ser louvor constante de Deus.

Paulo, querendo fazer tudo para o bem de todos, teve a experiência de Deus na dor e na alegria. Começamos a entender o seu convite: “Sede os meus imitadores, como eu o seu de Cristo!” (1Cor 11,1).

 5º Domingo do Tempo comum
Jô 7,1-4. 6-7; 1Cor 9,16-19.22-23; Mc 1,29-39
1) Uma verdade fundamental da vida (Jô 7,1-4. 6-7)

A vida de Jô, além de ser um exemplo de heróica entrega a Deus, é também um retrato do silencioso sofrimento de inúmeras pessoas. Quem recompensa a angústia de um pai de família diante da possibilidade de perder o emprego? Quem conhece e quem agradece pelas horas noturnas de preocupação de uma mãe, vendo as indecisões dos filhos, ou os perigos para a vida deles? Quem sara as chagas de tanto amor traído? A dor por vidas amadas ceifadas pela irresponsabilidade alheia? Sim, Jô existe, também hoje. “A vida do homem sobre a terra é uma luta” (1); “Lembra-te de que minha vida nada mais é do que um sopro, de que meus olhos não mais verão a felicidade” (7).

A maior dignidade de uma vida humana é poder aliviar sofrimentos, tirar dores e carregar uma parte da cruz de quem já não tem força. Todo jovem, toda jovem deve assumir isto; é a garantia de uma vida nobre e grande! E os pais que labutam saibam, eles transformam uma parte do mundo em esperança.

Sublime expressão desta maior dignidade é voltar-se para Jesus, lembrando suas horas de inefável solidão, de dor, de uma morte sem igual, tudo para salvar o mundo do mistério do pecado. O cristão que assim se une a Jesus, para com Ele salvar o mundo, é bem-aventurado.
2) Pregar e ser solidário (1Cor 9,16-19.22-23)

O homem, totalmente entregue a Cristo, faz duas coisas. Em tudo, por palavras, doutrina e gestos, ele quer ser anunciador de Jesus.

“Ai de mim, se eu não pregar!” (16). Não é meu mérito, é o misterioso plano d’Aquele que me escolheu para o sacerdócio. “Não é minha glória, é uma obrigação imposta a mim pelo próprio Deus” (cf. 16). Paulo diz que a vida do pregador deve se gastar também pelos outros.

Mas pode ser um perigo estar satisfeito por ter assumido tão santo ministério. “Eu me fiz servo de todos para ganhar o maior número possível... Fiz-me fraco com os fracos, a fim de ganhar os fracos... a fim de salvar a todos” (19.22).

Que venha o Espírito do Senhor Jesus e transforme os corações, ilumine a consciência e fortifique a vontade minha e a de todos os pregadores, de todos os catequistas e anunciadores. “Que júbilo será a minha eternidade, se eu tiver “ganhado fracos e salvado alguns!”
3) Quem tem um ministério, deve viver o mistério! (Mc 1,29-39)

A intensidade do trabalho de Jesus é impressionante. Em vez de gozar de uma hora de lazer e de uma companhia simpática na família de Simão Pedro e André, Ele não só cura a sogra, mas enquanto “levaram-lhe todos os enfermos e possessos do demônio e toda a cidade estava reunida diante da porta”, Jesus “curou muitos que estavam oprimidos de diversas doenças, e expulsou muitos demônios” (32s). E finalmente, como, se não precisasse de descanso, ou melhor: porque a presença de Deus Pai lhe é um misterioso descansaço, que os homens não conhecem: “tendo-se levantado muito antes do amanhecer, ele saiu e foi para um lugar deserto, e ali se pôs em oração” (35).

Quem serve ao Evangelho, quem exerce um ministério, deve sempre de novo ir à fonte, entregar-se ao Mistério de Deus. Só assim teremos a força de nos fazer tudo para todos.


4º Domingo do Tempo Comum

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Dt 18,15-20; 1Cor 7,32-35; Mc 1,21-28

Neste quarto Domingo, as leituras manifestam extraordinária força espiritual. Na primeira leitura temos a promessa que ultrapassa o AT; no Evangelho, Jesus se apresenta com um poder assustador; e a segunda leitura vê a vida sem matrimônio como possível símbolo do Reino de Deus.

1) Um profeta maior do que Moisés (Dt 18,15-20)

Já no deserto, o povo tremia diante da voz de Deus: “Que não nos fale o Senhor, para que não morramos!” “Fala-nos tu, Moisés, e nós te ouviremos” (Ex 20,19). A proximidade de Deus sempre tem algo de grandioso e inflige um santo pavor. Porque tudo que há no homem é marcado pela lei da morte e transitoriedade. Deus denuncia em nós o nosso ser tão relativo. Só se Ele se inclinar sobre a nossa miséria, poderemos levantar a cabeça.

Na leitura de hoje, temos a mesma reação do povo: “Não queremos mais escutar a voz do Senhor Deus, nem ver este grande fogo, para não acabar morrendo” (16).

Aí, Deus promete outro profeta. “Farei surgir para eles, do meio de seus irmãos, um profeta semelhante a ti” (18). João Batista, com suas obras extraordinárias, deixa surgir no povo a suspeita de ser ele o “profeta” prometido por Moisés. Perguntaram: “Quem és tu?” “És tu Elias?” Ele respondeu: “Não!” – “És o profeta?” Ele respondeu: “Não!” (Jo 1,21).

Esta era a grande e grave esperança do povo que surgisse um profeta maior do que todos os anteriores, simplesmente “o profeta”.

Embora o Evangelho não o diga abertamente, mas é esta a impressão que Jesus dá, de terem chegados os últimos tempos.

2) “O espírito mau, soltando grande grito, fugiu” (Mc 1,21-28)

O Reino do demônio é destruído em sua base pela vinda do Messias. Involuntariamente, o espírito maligno confessa a identidade de Jesus. “Jesus, Nazareno!” – “ Santo de Deus!” (24). Se grandes autores suspeitam que a fórmula “que há entre ti e nós” (23), seja uma tentativa do demônio de repelir a presença de Jesus, fato é que o maligno confessa: “Tu vieste para arruinar-nos, destruir-nos!” (24). Mais Jesus aproxima-se, mais satanás torna-se impotente. O portador de poderes satânicos, o demônio, sai do homem “soltando grande grito” (26). Seu reino de mentira, de engano e de “grandes feitos” é quebrado pela presença de Jesus.

Esta destruição do poder do inimigo é muito importante para a pureza de nossa fé e de nossa visão sobre a nossa vida. “Cala-te, sai dele!”, queira Jesus pronunciar esta poderosa palavra sobre a minha vida, para que já não haja nem vestígios de maldade, de falsidade, de poder diabólico em nenhum momento. - Unamo-nos ao povo, façamos nossa a atitude da multidão: “Todos então se admiraram, perguntando uns aos outros: Que é isso? Um novo ensinamento com autoridade! Até mesmo os espíritos impuros... obedecem-lhe!” (27).

3) Matrimônio e Virgindade (1Cor 7,32-35)

No contexto maior deste mesmo capítulo aos Coríntios, é clara e luminosa a doutrina cristã: tanto o matrimônio como a virgindade devem participar deste luta e vitória de Jesus sobre todo poder do maligno. O matrimônio é santo, é participação no mistério do Deus salvador (1Cor 7,9; Ef 5,32). Mas Paulo apresenta-se a si mesmo como modelo daqueles que querem fazer de sua vida um sinal luminoso da irrupção da graça santificadora neste mundo (cf. 1Cor 7,8). Paulo dá preferência à virgindade “para poder unir-se ao Senhor sem partilha” (35), mas também o matrimônio pode ser vida radicalmente cristã, levando-nos mais perto de Deus.

2º Domingo do Tempo Comum


1Sam 3,3-10.19: 1Cor 6,13c-15ª.17-20

1) Samuel ainda não conhecia Deus (1Sam 3,3-10.19)
Consagrado e entregue ao serviço no templo, pelos pais, o menino Samuel, embora no templo, vive em ambiente pernicioso. O sacerdote Heli está quase cego; seus dois filhos, sacerdotes, “eram maus, não conheciam o Senhor” (2,12)..., adulteravam o culto no templo (2,16s)... e faziam pecar o próprio povo (2,22-24s). Neste contexto, é quase visível que era a graça de Deus que protegia a inocência e a piedade do menino inexperiente.
E o outro aspecto: Deus cuida de nossa alma sem que nós saibamos. O menino “ainda não conhecia o Senhor” (3,7). Então, três vezes, Deus o chamou com insistência e com ternura. “Veio o Senhor, pôs-se junto do menino, que estava dormindo, e chamou-o como das outras vezes: “Samuel, Samuel!”(3,10). A resposta do menino tornou-se o início de uma grande aventura com Deus.
Minha vida deve e quer ser a resposta a tal chamamento, que desde a minha infância e sempre de novo se me dirige.

2) Todo o meu ser recebe a santa vocação (1Cor 6,13c-15a.17-20)
Um realismo enfático está na segunda leitura. Não é muito evidente se Paulo vê diante de si um fanatismo pneumático ou a presença de um gnosticismo grego que começasse a penetrar na comunidade de Corinto. Mas clara e confortadora é a doutrina de Paulo. A vida corporal e sexual não é demoníaca (como a Gnose dizia), nem deve ser endeusada (como o pansexualismo de hoje o faz), mas o corpo em toda a sua realidade participa da vocação divina da alma. A frase, que Paulo formula, eleva tudo muito acima de um moralismo pragmático e facilmente pessimista: “O Corpo é para o Senhor, e o Senhor é para o corpo” (13).
O corpo deve suportar a história com as suas vicissitudes. Que afirmação surpreendente lemos: Nossos corpos são “membros de Cristo” (15), e o homem todo, também o corpo, “torna-se um só espírito com o Senhor” (17). Esse texto mostra-nos a imensa distância do pensamento cristã frente às tendências desnorteadas que querem dominar a vida hoje. “Vosso corpo é templo do espírito santo... Por isso já não vos pertenceis... Fostes comprados por um grande preço” (19-20).

3) A vocação mais alta: sermos chamados por Jesus
Com sua indicação: “Eis o Cordeiro de Deus”, João Batista lança o grande tema do Evangelho de João, que se completará quando olharão para o transpassado (Jo 19,33-37).
Não é completa a vocação por Jesus, se não o vemos e entendemos como “Cordeiro” redentor, dado à humanidade pelo próprio Deus, e também oferecido a Deus em uma morte, que vencerá a morte de todo mundo.
Também sob este aspecto, fecha-se o cerco da beleza e do drama da revelação. No início do Evangelho, no texto de hoje, está dito: “Vinde e vede!” (39) e no ponto alto, diante da Cruz, da qual resultará a gloriosa ressurreição, o evangelista repete: “Olharão para aquele que transpassaram” (37).
Assim, André, que no início do Evangelho, após ter “visto” Jesus, chama o seu irmão Simão Pedro, para que também este visse e conhecesse a Jesus. Assim, nosso apostolado, nosso testemunho, nossa orientação deve ajudar a muita gente, para que, também eles, comecem a ver todo o mistério da redenção na encarnação do Filho de Deus no seio de Maria, e na Cruz, na qual Deus se fez vítima pelos pecadores.










EPIFANIA 
Is 60,1-6; Ef 3,2-3.5-6; Mt 2,1-12

Epifania revela todo o esplendor que na noite do nascimento parecia quase escondido. Epifania faz-nos ver na  face do menino Jesus, do jovem, do homem, do crucificado a vitória da divina majestade que nele habita. Fazendo-se Ele igual a nós, homem, quer tornar-nos semelhantes a ELE, em Sua divindade.
A palavra “epifania” significa em grego “aparição com esplendor e glória”. É o mostrar-se de um mistério. Nos primeiros tempos da Igreja, enquanto os pagãos     celebravam a aparição pública do Rei, do Imperador pagão, os cristãos concentravam toda a solenidade na festa do nascimento do Filho de Deus, a Epifania, e em muitos lugares no Natal, cuja celebração tem exatamente o mesmo conteúdo.
         A vida de Jesus, sua incomparável santidade, sua pureza, a divina profundidade de sua doutrina, o poder de seus milagres, tudo isto é a “aparição”, a “Epifania” de seu verdadeiro ser humano e divino. Ao perdoar os pecados sobre a Cruz, a epifania deste mistério tornou-se poderosa e plenificou-se na ressurreição. E a Igreja, em sua liturgia, proclama e, já neste mundo, perpetua a gloriosa epifania.


1) Todos os povos caminharão à Tua luz (Is 60,3)s
         A primeira leitura traz um magnífico pre-anúncio da gloriosa mensagem do Natal. De maneiro surpreendente, Isaías anuncia algo totalmente novo. Pensava-se, geralmente, que somente os Judeus seriam o povo eleito por Deus (cf. Dt 7,7-8). – Contrasta com isto o anúncio de Isaías: “As nações se encaminharão à Tua luz, e os reis, ao brilho de Tua aurora” (Is 60,3).  Já antes, o profeta Isaías tinha proclamado: “Quanto aos estrangeiros que desejam unir-se ao Senhor, para servi-lo e amar seu nome, para serem seus servos, se observarem o sábado sem profaná-lo,... eu os conduzirei ao meu monte santo e os cumularei de alegria na minha casa de oração (Is 56,6-7).
         São Paolo interpretará mais tarde este mistério da salvação de todos os povos na Epifania de Jesus (cf. Ef 2,11-18).

2) O grande dom do Messias: a herança para todos os povos (Ef 3,2.3a.5-6)
         Na segunda leitura de hoje, Paulo enfatiza a eterna beleza deste plano de Deus. 3 “Foi por revelação que me foi manifestado o mistério que acabo de esboçar.... 5 que em outras gerações não foi manifestado aos homens da maneira como agora tem sido revelado pelo Espírito aos seus santos apóstolos e profetas. 6 A saber: que os gentios são co-herdeiros conosco (que somos judeus), são membros do mesmo corpo e participantes da promessa em Jesus Cristo pelo Evangelho. 7 Eu me tornei servo deste Evangelho...”.

3) Os magos do Oriente, precursores do povos pagãos que chegarão (Mt 2,1-12)
Com a história dos magos, a Bíblia quer-nos mostrar como todos os homens, todos os povos encontrarão, em Jesus, o divino redentor. “A aparição daquela estrela os encheu de profunda alegria. 11 Entrando na casa, acharam o menino com Maria, sua mãe. Prostrando-se diante dele, o adoraram. Depois, abrindo seus tesouros, ofereceram-lhe como presentes: ouro, incenso e mirra”.
Não celebramos nem Epifania, nem Natal, se nós não nos ajoelharmos como os magos, se não oferecermos, ao menino nascido, o “ouro” de nosso amor, o “incenso” de nossa adoração e eterno amor a Ele, a “mirra” de nossa cotidiana participação na cruz do Senhor. Abramos os tesouros de nossa vida para Ele e para nossos irmãos.
Então, Epifania será minha caminhada, com toda a Igreja, com todos que buscam a luz e a verdade, em demanda do divino Redentor. O profeta Isaías tematizando isto, clama:
1 “Levanta-te, reveste-te de Luz, eis que vem a tua luz! A glória do Senhor se levanta sobre ti. 2 Vê, a noite cobre a terra e a escuridão, os povos, mas sobre ti levanta-se o Senhor, e sua glória te ilumina. 3 As nações se encaminharão à tua luz, e os reis, ao brilho de tua aurora. 5 A essa visão, tornar-te-ás radiante; teu coração palpitará e se dilatará...” (Is 60,1-5).  ( + Karl  Romer)








 Santa Mãe de Deus (01 01 2012)
Nm 6,22-27; Gal 4,4-7; Lc 2,16-21

1) A face de Deus sobre a humanidade Nm 6,22-27
O que realmente nos toca é a promessa de Deus, que se expressa nesta bênção que, dada originalmente a Moisés e a Arão, a Igreja coloca sobre o primeiro dia do ano novo. “O Senhor te mostre a Sua divina face e te conceda sua graça” (6,25). “Quem me vê – diz Jesus – vê também o meu Pai” (Jo 14,9). Esta divina face, seja no sorriso da criança no presépio ou nos braços de sua santa mãe, seja na hora da morte, estava aberta para nós, e continua aberta para todos os que guardam a fé e o amor a Jesus.
É belo começar um ano com esta certeza: “O Senhor te abençoe e te guarde! 25 O Senhor te mostre a sua face e conceda-te sua graça! 26 O Senhor volva o seu rosto para ti e te dê a paz!” (Nm 6,24-26).

2 A face do homem voltada para Deus (Gal 4,4-7)
São Paulo, na segunda leitura, resume, de certo modo, a redenção por Jesus Cristo, na corajosa palavra: “Deus enviou seu Filho, nascido da mulher, para que recebêssemos a sua adoção” (Gal 4,4s). Ser adotado é ser integrado em uma nova família. Como é que se pode pensar isso: adotados por Deus? Fazer parte, de modo inefável, da Santíssima Trindade? Aqui aparece, então, a radicalidade da encarnação do Filho de Deus em Maria. Podemos, devemos dizer que, em Jesus, filho de Maria, Deus se deixou adotar humanamente. Operou-se esse mistério pela mulher, Maria. Sim, Deus, o Filho eterno trinitário, aceitou caminhar neste mundo como cidadão de um país. Tolerou ser chamado “filho do carpinteiro”, trabalhar com suas mãos suadas. E mais, aceitou ser adotado até o último, sendo condenado, crucificado, sepultado. Esta misteriosa troca faz-nos entender um pouco mais o indizível mistério de sermos adotados por Deus. Não sabemos imaginar, mas cremos e confessamos com São Paulo: “Deus enviou seu Filho, para que recebêssemos a sua adoção”. Se nos é dado este acesso a Deus, devemos celebrar esta realidade: na oração e adoração! E devemos facilitar aos irmãos e ás irmãs o acesso a este divino mistério.
3) “Vamos e vejamos!” (Lc 2,16-21)
No versículo 15 (anterior ao nosso trecho do evangelho) diz Lucas: “Vamos até Belém e vejamos o que se realizou e o que o Senhor nos manifestou.”
Com esta palavra, os pastores convidam-nos a associarmo-nos a eles. Quer dizer, não podemos deixar a fé adormecida em nós. Devemos nos levantar e ver o que o Natal, em nossa vida, significa. Vejamos como os pastores pressentiram algo do mistério que se escondia na criança inerme e na mãe humilde santa. Diz o Evangelho: “Voltaram – do presépio – os pastores, glorificando e louvando a Deus por tudo o que tinham ouvido e visto, e que estava de acordo com o que lhes fora dito” (20). Nós não teremos celebrado o Natal, se depois nossa vida em nada participar da atitude dos pastores que, tendo-se ajoelhado, “glorificando e louvando a Deus” voltaram para seus rebanhos e para suas casas.
Convida-nos a nossa fé a iniciarmos o ano novo com este propósito. Espera-nos o mundo sem muito consolo, sem muita certeza, sem amor forte e puro. Mostremos a muita gente a certeza de que a Face de Deus está aberta e resplandece sobre nós, e que nossa face pode voltar-se para Ele com toda a confiança. Mas esta atitude não será de longa duração se não imitarmos ao mesmo tempo a primeira pessoa a viver e celebrar o Natal: Maria. “Maria conservava todas estas palavras, meditando-as no seu coração” (19). Só assim teremos a força e a alegria transbordante para testemunhar o Natal que, com Jesus e com Maria, celebramos.
Na união de oração e adoraçação  ofereço às prezadas irmãs e irmãos a pequena meditação e votos de abençoado ano novo.No SENHOR, cordialmente,    + Karl Josef Romer.




Meditações para o advento( Dom Romer) ano B

 4º Domingo do Advento
2 Sam 7,1-5.8b-12.14a.16; Rm 16,25-27; Lc 1,26-38
       Estive contigo em toda parte por onde andaste (2 Sam 7,1-5.8b-12.14a.16)
         Minha vida é dom e bênção de Deus. Os pais que Deus me deu, professores e mestres, amigos e pessoas veneradas que encontrei, tudo é graça. A síntese de vida de David é encantadora. De menino e jovem pastorzinho de ovelhas foi feito, por pura escolha de Deus, o grande rei do povo eleito, o senhor respeitado e temido. Mas os maiores benefícios recebidos não são garantia de podermos realizar todos, mesmo os mais sagrados sonhos. “Não és tu quem me edificará a casa (o templo) para Eu habitar” (5).
         Esta negativa por parte de Deus poderia decepcionar o velho rei David. Todavia em espírito de fé e gratidão, prostrado, ele faz a grande oração de entrega: “Tua é, Senhor, a grandeza, o poder, a honra, a majestade e a glória; tudo no céu e na terra é Teu... Senhor, nosso Deus, tudo o que preparamos para a edificação de um templo para o teu santo Nome, é Teu, e pertence a Ti” (cf. 1Cron 29,11-16).
         Embora não possa construir o templo, David recebe a bênção para sempre: “Suscitarei depois de ti a tua descendência... Eu serei (para teu descendente) um pai e ele será para mim um filho” (2Sam 17,11-14).
         2)    O mistério guardado em segredo durante séculos (Rm 16,25-27)
         Por caminhos tantas vezes indecifráveis, Deus realizou o que os profetas tinham prometido, e realizou-o plenamente em Jesus Cristo. Mas o mistério, manifesto agora em Jesus, ultrapassa infinitamente todas as expectativas. Jesus, em sua vida humana e na sua morte humana, esconde e revela o que Ele é: o Filho de Deus, feito homem. Assim, as palavras de hino que concluem a carta aos Romanos, e que a Igreja deve guardar como louvor sem fim, cantando por todos os séculos: “A Deus, único, sábio, por Jesus Cristo, glória por toda a eternidade. Amém!” (27).
        3)    Darás à luz um filho; ele será Filho do Altíssimo (Lc 1,26-38)
         Ser descendente da casa de David, humanamente, já não era título, porque já uns quinhentos anos essa dinastia era sem sucessor. Para o mundo, já se tratava de uma prerrogativa vazia. José e, certamente, também Maria eram longínquos descendentes de David. Somente Deus podia dar vida a essa esperança humanamente morta.
         Nenhum ser humano, mas somente Deus pode pronunciar sobre Maria este novo destino. A virgem fica perturbada não por ver o anjo, mas pelas três afirmações, sobre ela pronunciadas: “Ave, cheia de graça!”, “o Senhor está contigo”, “encontraste graça diante de Deus” (28.30).
         E então se abre a mensagem, que nenhum coração humano pode entender nem imaginar. De repente, Maria vê-se posta no centro de toda a história, em inefável intimidade com Deus, como portadora da resposta a todas as perguntas e angústias da humanidade: “Eis que conceberás e darás à luz um filho, e lhe porás o nome de Jesus. Ele será Filho do Altíssimo, reinará eternamente na casa de Jacó” (31.32).
         Diz ela: “Como se fará isso, pois não conheço homem?” (34). É exatamente na pobreza ontológica que se revela a incomensurável grandeza de Deus. Em Maria fica então visível que tudo, toda a obra salvadora de Deus, é graça, pura graça.
         Na resposta do anjo anuncia-se a absoluta e gloriosa ordem da salvação: “O Espírito Santo descerá sobre ti, e a fora do Altíssimo te envolverá com a sua sombra” (35). Maria é comparada ao monte Sinai (Ex 24,16), à tenda e ao Templo (Ex 40,34s; 1Reis 8,10s). Deus faz de sua virginal maternidade o primeiro templo do Novo Testamento. Nela irrompe o Natal para toda a humanidade. 


( + Karl Josef Romer)

 Advento 1º Domingo
Is 63,16b-17.19b; 64,2b-7; 1Cor 1,3-9; Mc 13,33-37
O Advento tem duas perspectivas, que aparecem claramente nos textos litúrgicos deste domingo: de um lado lembramo-nos como o povo de Deus do AT esperava a vinda de um salvador, de um Messias. E de outro lado, o Advento celebra a esperança da segunda vinda de Jesus, Juiz do universo, no fim do mundo.
1) Praticar a justiça com alegria (Is 63,16b-17.19b; 64,2b-7)
Não obstante todo o desvio das criaturas, o texto que a Igreja nos apresenta hoje, começa e termina com a exclamação: “Tu, Senhor, és nosso Pai”. No meio, no entanto, desenvolve-se o drama da nossa vida, marcada pelas promessas e pela fidelidade de Deus, mas igualmente preocupada para sempre, porque Tu ó Deus “escondeste de nós tua face e nos entregaste à mercê da nossa maldade” (6). Na verdade, não é Deus quem se escondeu, mas nós, operadores do mal, já não temos capacidade de perceber Sua divina proximidade. O profeta fala palavras duras: “Todos nós nos tornamos imundície (diante de Teus olhos), até nossas boas obras são corrompidas por intenções egoístas e falsas” (cf. 5). É nosso pecado que mantém Deus longe de nós. Isto é tanto mais grave, uma vez que “nenhum ouvido jamais ouviu, nenhum olho jamais viu que outro deus tivesse feito coisas tão maravilhosas como Deus o fez por nós” (cf. 64,3).
A nossa esperança é a misericórdia de Deus e sua onipotência. “Ah! Se rompesses os céus e descesses!” (63,19b [64,1]). – Nossa salvação é iniciativa de Deus, perdoando-nos e rompendo todos os obstáculos. ELE deve sobre nós “romper os céus” e “descer para nós” (19). Assim, termina o texto em uma grande confiança: “Tu és nosso pai, nós somos barro; tu, nosso oleiro, e nós todos, obra de tuas mãos” (7).
2) Fiel é Deus, por quem somos chamados em Jesus (1Cor 1,3-9)
Paulo, o mestre sábio, conhece as fraquezas e os possíveis desvios na comunidade de Corintos. Elogia os ricos dons da “palavra e conhecimento (gnose)” (5). Mas é necessário ligar tudo ao testemunho sobre Jesus Cristo. Paulo quer protegê-los contra o entusiasmo que abstrai da Cruz. “O testemunho sobre Cristo tornou-se firme em vós” (6). Este “Cristo crucificado para os judeus é escândalo, para os gentios, loucura” (1,23).
Tudo é graça. Mas Deus, que nos assumiu pelo batismo em Jesus Cristo, é fiel e completará a Sua obra em nós (cf. 9).
Enquanto os antigos esperavam “o Dia do Senhor” com pavor (cf. Am 5,18), o cristão tem a esperança de chegar “irrepreensível ao Dia de nosso Senhor Jesus Cristo” (8). Este é o Advento escatológico.
3) Não sabeis quando o Senhor voltará (Mc 13,33-37)
O Evangelho abre-nos a perspectiva do Advento definitivo, isto é da última vinda do Senhor. Como toda a nossa vida é puro dom de Deus, para o qual nada, ou pouco, temos colaborado, assim, a vinda do salvador para nos levar para a glória do Pai, é ainda uma vez expressão da absoluta graça, da gratuidade que não se pode calcular. A esta total soberania de Deus corresponde da parte da criatura a radical escuta, a espera, a esperança. Como o Senhor Deus, em Jesus Cristo, vem para nos levar à glória infinita, só podemos fazer uma coisa: vigiar para estarmos prontos em qualquer momento. Qualquer outra atitude é leviandade. Deus Santo, de quem somos imagem, vem para nos dar o triunfo de Sua graça, o triunfo de nossa fidelidade. Em, Seu amor de Salvador, Jesus nos convida: “Ficai de sobreaviso, vigiai;... Para que, vindo (o Senhor) de repente, não vos encontre dormindo. O que vos digo, digo a todos: vigiai!” (33.36-37).

Advento 2º Domingo (Ano B)
(Is 40,1-5.9-11; 2Pd 3,8-14; Mc 1,1-8)


Enquanto a primeira leitura abre a perspectiva da libertação do povo eleito da escravidão, as duas outras concentram-se nas duas vindas do Senhor: a vinda como Messias e vinda gloriosa como juiz, no final.

1) Abri no deserto um caminho para o Senhor (Is 40,1-5.9-11)
            Inicia-se com esse texto a segunda parte do profeta Isaías. A esperança eclode: Ciro, rei da Pérsia, derrubou o poder de Babilônia. O povo de Deus, exilado durante 70 anos, será libertado e voltará para a terra de Deus. “Uma voz exclama: Abri no deserto um caminho para o Senhor, traçai reta na estepe uma pista para nosso Deus” (3). Pode ser lembrado aqui o costume de um antigo povo que, em altas montanhas, acendia fogueiras para, de noite, anunciar aos espias em outra longínqua montanha a notícia jubilosa: “Os nossos soldados estão voltando vitoriosos”. Clama o profeta: “Subi a uma alta montanha, para anunciar a boa nova a Sião. Elevai com força a voz, para anunciar a boa nova a Jerusalém” (9). O profeta vê nesta triunfante volta à pátria um símbolo prototípico da intervenção grandiosa de Deus no meio de seu povo. No júbilo do povo que voltará já se esconde a certeza de que, no fim do mundo, Deus trará de volta, pelo deserto deste mundo, todos os Seus.

2) Deus não quer que ninguém pereça (2Pd 3,8-14)
O texto da segunda carta de S. Pedro muda a perspectiva dos eventos apocalípticos. É verdade: “os céus passarão, os elementos se dissolverão, e será consumida a terra com todas as obras que ela contém” (10). Porém, tudo isso, com toda a sua gravidade, indica algo maior: “Nós, porém, segundo sua promessa, esperamos novos céus e uma nova terra, nos quais habitará a justiça” (13). O desaparecimento da vida velha será o indício do surgimento de algo novo, infinitamente mais belo.
Para São Pedro, o retardar do fim do mundo é sinal da paciência de Deus que oferece uma nova oportunidade aos que não estão preparados (9).
Com vigorosa confiança e sem medo, os fieis podem esperar a vinda do Senhor, porque a graça de Deus lhes permitirá serem “por Ele achados sem mácula e irrepreensíveis na paz” (14).

3) Não sou digno de Lhe desatar a correia do calçado (Mc 1,1-8)
Os Evangelhos de Marcos (1,3) e de Mateus (3,3) nos anunciam a mensagem de João Batista, segundo o qual a estrada pelo deserto não será apenas para o povo poder voltar do exílio, mas será a estrada pela qual virá o próprio Messias e Salvador. E João “pregava um batismo de conversão para a remissão dos pecados” (4). Deus não força a liberdade do homem. Por isso, o arrependimento e a conversão são necessários para que Deus possa chegar até nós.
Quem, no Advento, se prepara para a vinda do Salvador, na festa do Natal, e mais ainda na última vinda de Jesus, que já pode estar próxima, deve vivenciar em si a atitude de João. Queremos esperá-Lo com sincera esperança e com a alma em júbilo, mas devemos repetir em nossas silenciosas orações: “Ante Aquele que vem, não sou digno de me prostrar para desatar-lhe a correia do calçado” (7). Se assim eu O esperar, então em minha vida muitos vales e depressões serão “aterrados”, “montanhas e colinas de indigna pretensão serão abaixadas” e “escarpas niveladas” (cf. Is 40,4). Saibamos ouvir e acolher o clamor do Profeta: “Abri, no deserto de vossa vida, um caminho para o Senhor, traçai reta na estepe uma pista para nosso Deus” (cf. Is 40,3).(  + K.J. Romer)



B 11 Advento 3º Domingo
Is 61,1-2a.10-11; 1Ts 5,16-24; Jo 1,6-8.19-28;
1)          Exulte o meu coração de alegria em meu Deus Is 61,1-2a. 10-11
Quem é chamado a assumir um ministério de Deus, deve primeiro ser tocado pelo mistério. Diz Isaias, ao anunciar a intervenção de Deus: “O Espírito do Senhor repousa sobre mim, porque o Senhor consagrou-me pela unção” (1). É o ápice de todo profetismo poder anunciar a beleza intrínseca da Cidade de Deus, da Jerusalém restaurada por Deus (cf. Is 60). Nela “ressoará a boa nova aos humildes, se dará a cura dos corações doloridos e se oferecerá aos cativos a redenção, aos prisioneiros a liberdade, um ano de graça da parte de Deus” (1-2).
         De longe aparece aqui a mensagem solene e vigorosa de Jesus, que vê neste texto o seu retrato: “Deus fez-me revestir as vestimentas da salvação, envolveu-me com o manto de justiça, como um neo-esposo cinge o turbante...” (10; cf. Lc 4,16-21). – Na face da Igreja inteira deve começar a resplandecer a jubilosa certeza de ter começado a restauração definitiva.

     2)      Irrepreensíveis para a vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo 1Ts 5,16ss 
Leis humanas são necessárias. Não raro, porém, algumas delas contradizem a Lei fundamental de Deus. Para saber “abraçar o que é bom” e para “guardar-se de toda espécie do mal” (21) é absolutamente indispensável possuir uma norma que esteja acima de metas interesseiras ou de programas partidário-políticos. Precisamos da luz clara e das normas infalíveis do Absoluto. - Em última instância, somente Deus pode ser esta norma. Quem se submete a Deus com fé e amor, receberá esta imensa graça: “Que todo o vosso ser, espírito, alma e corpo, seja conservado irrepreensível para a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo” (5,23). Que Ele assim nos encontre na Sua segunda vinda, na hora de nossa morte!
      3)    “No meio de vós está quem não conheceis” (Jo 1,6-8.19-28)
“Não sou o Cristo” (20), com esta resposta, João diz o que é decisivo para a auto-identificação de cada um de nós. Para conhecermos a nós mesmos é importante saber o que não somos, nem podemos ser. “Há os que se consideram deuses, querendo decidir sobre quem é digno de viver e quem pode e deve ser eliminado”, dizia o Papa Bento XVI no dia de sua chegada à XXVI Jornada Mundial da Juventude (Madrid, 18 08 2011).
É grandiosa a comparação que João faz: “Eu não sou digno de lhe desatar a correia do calçado” (27). É este o ponto de partido para pensarmos sobre aquilo que nós realmente somos. Cristo Jesus acolhe-nos em Sua luz e nos faz portadores de Sua dignidade humana e divina.
Se desatarmos a correia do calçado de uma pessoa cansada, se pensarmos feridas de quem sofre, se ouvirmos o que uma alma atormentada nos confia, então estaremos exatamente no meio entre a primeira e a segunda vinda do Senhor, já trazendo em nós o princípio da Sua dignidade e Santidade, que nos advém da sua primeira vinda, e nos prepara, cada dia, para a segunda.
Este é para nós o grande anúncio para o Natal: “No meio de vós já está quem não conheceis” (26). Ele já está em nosso meio, e vem cada vez mais na medida em que em nós recebemos a Sua divina mensagem e abrimos, em nossa vida, espaço para ele estar “no meio de nós”.





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